Sites Bloqueados: Ministério da Cultura já reagiu

O Ministro da Cultura já respondeu às questões levantadas pelo Bloco de Esquerda (BE) sobre o bloqueio de sites legítimos. O problema foi levantado esta sexta-feira na Assembleia da República (AR).

Em causa está o bloqueio de sites legítimos, tais como o carbongames.com. O BE exige que o Memorando de Entendimento, que estava a ser trabalhado há três meses, seja suspenso, e ainda que se façam alterações ao Decreto-Lei 66/2015, de 29 de Abril.

“Os procedimentos previstos no memorando celebrado visam, precisamente, evitar qualquer possibilidade de existirem bloqueios injustificados, oferecendo garantias acrescidas para evitar qualquer eventualidade nesse sentido”, pode ler-se num comunicado divulgado esta sexta pela AR.

O Ministério da Cultura justifica o bloqueio de sites com a Lei do Comércio Eletrónico; contudo, a IGAC (que por norma bloqueia sites que disponibilizam e que dão acesso a obras disponibilizadas ilicitamente) impede o acesso a sites inexistentes na internet. Esta organização têm ainda bloqueado endereços que contém apenas links, sem que tenham alojadas alguma obra, conforme noticiamos.

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IGAC e MAPiNET não cumprem o Memorando de Entendimento

Pelas várias notícias que demos nas últimas semanas, já era visível que o cumprimento do memorando de entendimento pelo IGAC e MAPiNET sempre foi algo questionável. Agora, já existem provas relativamente ao caso do bloqueio da Ultimate Music que garantem que nenhuma desta entidade está a respeitar o que assinaram em Agosto de 2015.

A Paula Simões tem sido uma referência nesta batalha contra a censura online e publicou no seu blogue uma análise dos documentos que requereu à IGAC e MAPiNET sobre o bloqueio do site do espanhol Josep Vinaixa.

No dia 28 de Janeiro, solicitou à IGAC os documentos que estiveram na base da decisão administrativa de bloquear o site do Josep Vinaixa, documentos esses listados no ponto 1 da cláusula 5ª do Memorando de Entendimento; passados mais de 10 dias sem obter resposta e depois de vários contactos com a IGAC, a Paula apresentou queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). No dia 29 de Fevereiro, depois de contactada pela CADA, a IGAC envios três documentos:

O primeiro foi um documento onde o MAPiNET declara “sob compromisso de honra, que não foi autorizada a colocação à disposição do público em geral nem a utilização seguinte:” e onde pede de seguida o bloqueio do site http://josepvinaixa.com, mencionando a Audiogest como titular dos direitos/sociedade de gestão coletiva e referenciando dois ficheiros, um denominado Links.xls, indicado como o ficheiro com o “número total de links denunciados” e outro denominado josepvinaixa.com_anastacia-ultimate-collection.pdf, indicado como o ficheiro com amostras das obras. De notar que a IGAC não enviou nenhum destes dois ficheiros;

O segundo, uma declaração onde o MAPiNET declara “sob compromisso de honra” que “obtivemos uma resposta negativa ou não obtivemos qualquer resposta dos contactos efetuados nos seguintes websites:”, indicando de seguida o site do Josep Vinaixa, entre outros que foram retirados porque apenas foi requerido o processo do Ultimate Music.

Por fim, foi a notificação da IGAC aos ISPs, para estes bloquearem a lista de sites em anexo. Este documento é irrelevante para esta análise, uma vez que ele é posterior à decisão de bloqueio.

Note-se que o Memorando de Entendimento lista mais documentos do aqueles que foram enviados, portanto foram pedidos os ficheiros em falta à IGAC. Este argumentou que já tinha dado todos os documentos, no entanto, não sendo verdade, foi feito um novo pedido à CADA, que ainda está a ver analisado.

No entanto, com estes documentos já é possível analisar a situação do bloqueio e ter uma ideia de como a IGAC decide bloquear sites. Especificamente, qual é a informação em que a IGAC se baseou para bloquear o site do Josep Vinaixa?

Declaração do MAPiNET, sob compromisso de honra, em que a utilização feita não foi autorizada pelos titulares dos direitos

Deste ponto, a IGAC apenas sabe que o MAPiNET diz que a utilização que o Josep está a fazer dos conteúdos não foi autorizada. Se analisarmos o site Ultimate Music verificamos que o Josep apenas usa conteúdos oficiais, que foram previamente disponibilizados ao público pelas editoras, através da funcionalidade denominada embedding. Ora, o Josep só consegue usar esta funcionalidade porque as editoras, que disponibilizaram os conteúdos, autorizaram o uso dessa funcionalidade.

Localização geral do site

Deste ponto, a IGAC apenas sabe que o MAPiNET diz que há conteúdos não autorizados no site http://josepvinaixa.com. Ora, um site pode conter dezenas, centenas ou milhares de conteúdos. Por outro lado, o MAPiNET não representa todos os titulares dos direitos. Seria impossível à IGAC determinar quais os conteúdos não autorizados. Por esta razão, o Memorando de Entendimento determina que seja enviada à IGAC a indicação da“localização exata das obras e prestações ilicitamente disponibilizadas”.

No caso do site Ultimate Music, o que seria a localização exata das obras? Poderia ser, por exemplo, para uma música ou para um vídeo: http://josepvinaixa.com/qualquercoisa.mp3 ou http://josepvinaixa.com/qualquercoisa.mp4.

Ora, no caso específico deste site, o MAPiNET nunca conseguiria dar a “localização exata das obras e prestações ilicitamente disponibilizadas” pela simples razão de que as obras que vemos através do site do Josep não estão no site do Josep, mas sim nos perfis oficiais das editoras. Na realidade, o Josep não está a disponibilizar ilicitamente nenhuma obra, uma vez que o Josep não está a disponibilizar obra alguma. Quem está a disponibilizar as obras, neste caso, são as editoras.

Se o MAPiNET acha que as editoras não podem disponibilizar as obras, nem podem autorizar o público a usar o embedding, o MAPiNET tem é de falar com as editoras e não com o Josep.

Nomeação da sociedade de gestão coletiva que representa os titulares dos direitos

Deste ponto, a IGAC sabe apenas quem pediu o bloqueio.

Documento com uma amostra das obras dos titulares dos direitos;

Deste ponto, a IGAC tem conhecimento de uma amostra das obras dos titulares dos direitos, que imagino possa servir para comparar com as obras que estão no site. Já deu para perceber que a IGAC não tem informação sobre a localização exata das obras, pelo que não poderá fazer a comparação. Este documento não me foi enviado, mas pelo nome do ficheiro, parece referir-se a uma compilação chamada Ultimate Collection, lançada pela Anastacia. Josep diz que não usa nenhum conteúdo desse álbum no site. De facto, o artigo do Josep sobre o álbum tem uma pequena introdução informativa, depois lista a tracklist, sem links, de seguida mostra um vídeo, através de embedding de uma atuação da Anastacia e por fim coloca links para a compra do álbum no iTunes.

O único conteúdo, deste artigo, que eventualmente pode ter problemas será o vídeo, pelo que teremos de verificar de onde vem este vídeo.

um_video

Como o Josep usou a técnica de embedding, se clicarmos no link “Veja no http://www.youtube.com”, vamos ter à localização exata do vídeo. Note-se que quem colocou o vídeo no YouTube (ARD) autorizou o share via embedding:

screen-shot-2016-03-10-at-19-02-44Do site do YouTube, conseguimos alguma informação: sabemos que o vídeo foi disponibilizado ao público por uma pessoa ou entidade chamada (ou que se auto-denomina ARD), sabemos que o YouTube certifica que este utilizador é quem diz ser (ao lado do nome de utilizador aparece um visto, que tem uma tooltip com a indicação de verified, tal validação não é dada pelo YouTube a pedido do utilizador, mais info aqui). Precisamos agora de saber quem é o utilizador ARD. Podemos clicar no nome e consultar o About, mas se não soubermos alemão ou mesmo com a tradução automática do Chrome, não ficamos com muito mais informação.

No entanto, no fim da página vemos alguns links para algumas redes sociais e sites que parecem oficiais, sendo que o link para o impressum (imprint) nos dá informação legal e fiscal, bem como moradas e contactos de representantes do ARD. Se não tivéssemos já a verificação do YouTube, poderíamos sempre observar que o perfil no YouTube tem um link para o site oficial, mas o site oficial também tem um link para o YouTube. Uma pesquisa web ou na Wikipedia mostra-nos também que o ARD é um consórcio de emissores de rádio e televisão públicos alemães.

Ora, é altamente improvável que uma entidade pública esteja a partilhar e a permitir o embedding de conteúdos sem autorização dos titulares dos direitos. Mas mesmo que isso acontecesse, nem o MAPiNET, e muito menos a IGAC, poderiam ir atrás do Josep, mas sim deveriam falar com quem partilha e autoriza o embedding, que neste caso é o ARD.

Declaração sob compromisso de honra de que o MAPiNET obteve uma resposta negativa ou não obteve qualquer resposta dos contactos efetuados.

Mais uma vez, deste ponto, a IGAC apenas sabe que “o MAPiNET diz que…”. Mas, ao contrário dos anteriores, este documento fornece-nos uma informação valiosa. É que o Memorando não exige este documento. Exige, sim, consoante a situação (alínea f) do ponto 1 da cláusula 5ª no Memorando:

 

1. documento comprovativo de que o MAPiNET obteve resposta negativa dos titulares dos sítios da Internet ao pedido de remoção dos conteúdos;

De todos os documentos que o Memorando exige, este é o único a partir do qual a IGAC pode ver a justificação, e portanto a defesa, do dono do site que está a ser acusado.

No caso em apreço, sabemos que o MAPiNET trocou vários emails com o Josep, como vimos no nosso artigo. No entanto, o MAPiNET não deu esta informação à IGAC. Se o tivesse feito não teria necessidade de enviar uma declaração sob compromisso de honra.

 

2. documento comprovativo de que o MAPiNET não obteve resposta dos titulares dos sítios da Internet ao pedido de remoção dos conteúdos;

No caso de não obter resposta, o MAPiNET deveria enviar um recibo de envio/leitura à IGAC, para que esta tivesse acesso aos contactos dos titulares do site e pudesse confirmar por si própria.

 

3. documento comprovativo de que o sítio da Internet em causa não disponibiliza contactos.

No caso do site não ter contactos, o MAPiNET deveria enviar um screenshot do site ou a IGAC poderia fazer a confirmação através do URL.

Conclusão

O MAPiNET não está a enviar todos os documentos exigidos pelo Memorando e a IGAC não está a pedi-los, como vimos no caso do bloqueio do Ultimate Music.

A informação que a IGAC está a receber do MAPiNET é criada pelo MAPiNET (“o MAPiNET diz que…”). Os documentos que eventualmente poderiam ser usados como evidências (a localização exacta das obras; a defesa da pessoa que está a ser acusada) não estão a chegar à IGAC.

Mesmo não tendo provas ou evidências entregues pelo MAPiNET, a IGAC também não está, ela própria, a analisar os pedidos de bloqueio: se o fizesse nunca teria bloqueado o site Ultimate Music, uma vez que este site não disponibiliza obras, nem dá acesso ilegítimo a obras disponibilizadas por terceiros. Acresce a este argumento, que poucos dias depois de se saber do bloqueio do Ultimate Music, veio a público o bloqueio de um outro site cujo domínio nem sequer estava registado, ou seja, a IGAC mandou bloquear um site, que não existia (entretanto o site foi registado por alguém e mais recentemente foi desbloqueado em pelo menos alguns ISPs).

Assim, o MAPiNET pode incluir na lista de, pelo menos, 50 sites que envia à IGAC de 15 em 15 dias, os websites que lhe apetecer (porque não gosta do que lá se diz, por exemplo), que a IGAC manda bloquear.

Depois de fazer esta análise, Paula considera que este Memorando é claramente um instrumento censório. Nós partilhamos desta mesma opinião, e vamos continuar a aguardar mais desenvolvimentos nesta situação.

O nosso muito obrigado à Paula pela investigação excelente que tem vindo a fazer desde que estas situações foram detectadas. É bom para nós e para todos os utilizadores de internet em Portugal terem aliados com a Paula!

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Site “pirata” inexistente bloqueado

O acordo de anti-pirataria entre os grupos anti-pirataria, o nosso conhecido MAPiNET, e os fornecedores de serviços locais (ISP’s), resultou em danos colaterais. A lista de sites bloqueados foi recentemente atualizada com um domínio inexistente, após um possível erro de uma dessas entidades.

Nos últimos tempos têm sido muitos os bloqueios de sites feitos por alegadamente terem conteúdo pirata. Os bloqueios sem ser necessária autorização de um tribunal foram autorizados desde meados do ano passado, através de um acordo que também inclui o Ministério da Cultura e os operadores de internet. Estando o acordo tão passível a erros, e não havendo uma verificação rigorosa, poderemos assistir a casos que possam por a nossa liberdade em risco, e foi isso que voltou a acontecer.

Este novo caso fala do site “forummaximus.net”, site este que nem sequer existia na altura em que foi bloqueado.

A decisão estaria provavelmente direcionada ao site “forum-maximus.net”, com hífen, mas alguém ao longo do processo cometeu um erro.

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Como resultado, a lista de bloqueios em Portugal incluíu um domínio que ainda nem sequer tinha sido registado na altura. Depois das notícias se terem espalhado, alguém registou o url. Mas o acesso a este site continuou impedido, mesmo não existindo qualquer conteúdo pirata no site:

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O site correto foi entretanto bloqueado, mas o “forummaximus.net” (sem hífen) continua bloqueado e aguardar uma nova verificação.

Neste caso os danos são limitados. Contudo, a falta de verificação em torno dos urls bloqueados é preocupante, visto que não existe a necessidade de uma ordem judicial, e os bloqueios estão a ser feitos por terceiros sem qualquer tipo de restrição.

Este é um excelente exemplo de quão facilmente um site não pirata pode ser bloqueado e que demonstra as fragilidades e os potenciais problemas quando é possível bloquear um site sem qualquer parecer de um tribunal.

Fonte: TorrentFreak

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Bloco de Esquerda apresenta proposta para suspensão do Memorando

O Bloco de Esquerda entregou hoje, na Assembleia da República, uma pergunta sobre o bloqueio abusivo que foi feito pela SRIJ assim com um projecto de resolução que recomenda ao Governo a suspensão imediata do Memorando de Entendimento bem como que efectue as alterações necessárias ao Decreto-Lei 66/2015, de 29 de abril.

Foi através do blogue da Paula Simões que soubemos e tivemos acessos aos documentos que o Bloco entregou hoje na Assembleia. São três perguntas essenciais que esperemos ver respondidas em breve:

1- Considera o Ministro da Cultura aceitável o bloqueamento de sites legítimos como o www.carbongames.com?

2- Considera o Ministro da Cultura justificável um mecanismo que permite bloqueamento injustificado de espaços na internet?

3- Vai o Ministro da Cultura, através do IGAC, rescindir o Memorando de Entendimento e alterar o DecretoLei n.º 66/2015, de 29 de abril, face às suas características censórias?

Para além disso, foi apresentada também um projecto de resolução onde é pedido a “extinção imediata do Memorando de Entendimento” e também que “proceda às alterações necessárias ao Decreto-Lei 66/2015, de 29 de abril, para garantir a defesa da liberdade de partilha e acesso a informação.”

Sem dúvida esta é uma excelente notícia para nós e para todos os que estão contra estas medidas de censura que têm vindo a ser aplicadas nos últimos meses. Vamos aguardar novos desenvolvimentos sobre estas propostas, e aguardaremos também as respostas do Governo e do Ministério da Cultura às perguntas impostas pelo BE.

Ver Pergunta do BE
Ver Projecto de Resolução

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